quinta-feira, 28 de abril de 2016

O escapulário de Nossa Senhora do Carmo

A Santa Igreja nos oferece numerosos recursos para alcançarmos o nosso objetivo supremo: a eterna salvação. O uso do Escapulário é um dos mais eficazes.
Dentre todos os "negócios" de que nos ocupamos nesta vida, há um de tão grande importância que deve ser tratado com absoluta prioridade, sob pena de fracassarmos em todos os outros: nossa salvação eterna! Certo dia, um repórter meu amigo Virgen del Carmen Vitral-Catedral Autun Francia.jpgresolveu fazer em várias cidades uma pesquisa sobre este assunto. Percorrendo as ruas, perguntava aos transeuntes: "Você quer ir para o Céu ou para o Inferno?" Impactadas, as pessoas respondiam, quase sem refletir: "Claro que quero ir para o Céu!" E tocavam em frente...
Alguns, nosso repórter conseguia reter por mais um instante e fazer a segunda pergunta: "Quais os meios que você emprega para alcançar tão grande felicidade?" Resultado da pesquisa: 100% querem ir para o Céu. Porém, menos de 1% se preocupa sobre como fazer para lá chegar! São abundantes esses meios. Vamos aqui indicar um dos mais eficazes, que a Mãe de Misericórdia põe à disposição de todos, sem qualquer exceção. Quem se julgar indigno, por ser grande pecador, lembre-se do que disse Jesus: "Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores" (Lc 5, 32).
Trata-se do uso do Escapulário do Carmo, recomendado por vários Papas e Santos. Um destes, São Cláudio de La Colombière, afirma: "Não basta dizer que o Escapulário é um sinal de salvação.
Eu sustento que não há outro que faça tão certa nossa predestinação".
Os grandes privilégios do Escapulário
No dia 16 de julho de 1251, São Simão Stock suplicava a Nossa Senhora ajuda para resolver um problema da Ordem Carmelitana, da qual era o Prior Geral.
Enquanto ele rezava, a Virgem apareceu- lhe, trazendo o Escapulário nas mãos, e disse essas confortadoras palavras: "Filho diletíssimo, recebe o Escapulário da tua Ordem, sinal especial de minha amizade fraterna, privilégio para ti e todos os carmelitas. Aqueles que morrerem com este Escapulário não padecerão o fogo do Inferno. É sinal de salvação, amparo e proteção nos perigos, e aliança de paz para sempre".
A Igreja assumiu o Escapulário e fez dele uma das devoções mais difundidas entre o povo de Deus.
Em nossa época de superstições, não é supérfluo esclarecer que o Escapulário está longe de ser um sinal "mágico" de salvação. Não é uma espécie de amuleto cujo uso nos dispensa das exigências da vida cristã. Não basta, portanto, carregá-lo ao pescoço e dizer: "Estou salvo!" É verdade que Nossa Senhora não pôs condição alguma ao fazer sua promessa. Simplesmente afirma: "Quem morrer com o Escapulário não padecerá o fogo do inferno".
Não obstante, para beneficiar-se deste privilégio, é preciso usar o Escapulário com reta intenção.
Neste caso, se na hora da morte a pessoa estiver em estado de pecado, Nossa Senhora providenciará, de alguma forma, que ela se arrependa e receba os sacramentos. E nisto a misericórdia da Mãe de Deus se mostra verdadeiramente insondável! Alguns exemplos atestam de modo eloqüente esta verdade.
Viajando de automóvel em companhia de um bispo, o autor deste artigo viu uma mulher entrar distraída na rodovia e ser esmagada por uma enorme carreta cujo motorista não teve tempo de frear. O bispo mandou parar o automóvel, desceu apressadamente, deu a absolvição sacramental e ministrou a unção dos enfermos à mulher agonizante.
Depois comentou comovido: "Ela estava com o Escapulário do Carmo. Certamente foi Nossa Senhora quem providenciou que um bispo estivesse passando por aqui, justo neste momento!" Um caso diferente - narrado por Dom Marcos Barbosa na obra "O Escapulário de Nossa Senhora do Carmo" - se passou na Inglaterra. Na hora da morte, um cavaleiro conhecido por sua grande impiedade, em vez de pedir a Deus perdão de seus pecados, blasfemava dizendo: "Quero o inferno e o diabo!" Os presentes, horrorizados, chamaram São Simão Stock, o qual tomou o Escapulário e estendeu- o sobre o blasfemador.
Imediatamente este se arrependeu e pediu os sacramentos
Segundo antiga e piedosa tradição, a Santíssima Virgem, aparecendo ao Papa João XXII, prometeu livrar do Purgatório, no primeiro sábado após a morte, todos os que portarem devotamente o Escapulário. Este é o chamado "privilégio sabatino".escapulario.jpgPara se beneficiar dele é preciso manter a castidade segundo o próprio estado, recitar o Pequeno Ofício da Imaculada ou rezar um terço todos os dias.
E mais: cada vez que o devoto beijar o Escapulário com piedade, fazendo um pedido à Santíssima Virgem, recebe uma indulgência parcial, isto é, a remissão de uma parte das penas que devia cumprir no Purgatório.
Quem usa o Escapulário pode beneficiar-se também de indulgência plenária (remissão de todas as penas do Purgatório) no dia em que o recebe, na festa de Nossa Senhora do Carmo, 16 de julho; de Santo Elias, 20 de julho; Santa Terezinha, 1º de outubro; dos santos carmelitas, 14 de novembro; São João da Cruz, 14 de dezembro; São Simão Stock, 16 de maio.
Proteção nos perigos da vida quotidiana
Nossa Senhora, a melhor de todas as mães, quer para seus devotos filhos não somente os benefícios espirituais, mas também os temporais. Assim, quem porta seu Escapulário recebe d'Ela uma proteção especial nos perigos da vida quotidiana São inumeráveis os exemplos desse desvelo da Virgem Mãe por seus filhos.
Dom Marcos Barbosa, na obra mencionada acima, narra dois bem interessantes.
Em Santo André (SP), uma menina de 5 anos caiu dentro de um poço de 20 metros de profundidade. Uma hora depois, foi encontrada boiando sobre a água, com o Escapulário no pescoço. A família, naturalmente, atribuiu o fato à proteção da Mãe do Carmelo.
Em São Paulo, um jovem de 15 anos, ao atravessar de bicicleta uma via férrea, foi apanhado pelo trem. Passado todo o comboio, ele se levantou ileso e, beijando comovido seu Escapulário, exclamava: "Só tive tempo de gritar: ‘Nossa Senhora do Carmo!' Foi o bentinho d'Ela que me salvou!"
Sinal de aliança com Nossa Senhora
O Escapulário é um sinal de aliança com Nossa Senhora, e exprime nossa consagração a Ela. Seu uso é um poderoso meio de afervorar os que vivem em estado de graça e de converter os pecadores.
Deus não deixa sem recompensa nenhum benefício feito a uma pessoa necessitada, mesmo um simples pedaço de pão dado a um indigente. Imagine, pois, como Ele recompensará quem ajudar na salvação de uma alma! Seja, portanto, você também, um ardoroso propagador do santo Escapulário! Nossa Senhora lhe retribuirá com toda espécie de graças e favores já nesta terra; e mais ainda no Céu.  (Revista Arautos do Evangelho, Jul/2004, n. 31, p. 18 a 20).
Fonte: http://www.arautos.org/artigo/59/o-escapulario-de-nossa-senhora-do-carmo.html

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Anunciação do Senhor


Naquele tempo, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da
Galileia, chamada Nazaré, a uma Virgem, prometida em
casamento a um homem chamado José....


Se nos fosse dado contemplar a imensidade dos possíveis de Deus, ou seja, o incontável número de seres que Ele poderia ter criadoAnunciacião do Senhor - Benvenuto Tisi - Galeria Nacional - Parma.jpgem sua onipotência, veríamos criaturas semelhantes às deste mundo, mas sem os seus característicos defeitos. Por exemplo, ouriços constituídos sem meios de causar mal aos homens; pernilongos lindíssimos dotados de uma picada agradável e benfazeja; urubus de figura tão elegante quanto os seus voos, e assim por diante.
Por que não pôs Deus no universo criaturas assim, sem qualquer defeito, as quais poderiam ter sido criadas e não o foram?
Pergunta esta de difícil resposta. O certo, porém, é que no universo no qual vivemos três criaturas são insuperáveis: a humanidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, unida hipostaticamente à divindade; a visão beatífica e Nossa Senhora.1 Todos os outros seres, considerados individualmente, poderiam ser mais perfeitos.
Ora, este mundo composto por criaturas com deficiências é, entretanto, ótimo no seu conjunto, como ensina São Tomás de Aquino: "O universo não pode ser melhor do que é, se o supomos como constituído pelas coisas atuais, em razão da ordem muito apropriada atribuída às coisas por Deus e em que consiste o bem do universo. Se apenas uma dessas coisas se tornasse melhor, a proporção da ordem estaria destruída, como a melodia de uma cítara ficaria destruída se uma corda se tornasse mais tensa do que deve".2
O universo criado por Deus tinha de ser o que mais O glorificasse, porque Ele não poderia ter escolhido criá-lo de forma nem um pouco inferior ao mais adequado. E tudo quanto nele existe de defectivo serve para o homem ter presente a sua debilidade, fraqueza e dependência contínua de Deus. Lembra-lhe, enfim, sua contingência. É deste mundo, com deficiências, que nós fazemos parte.
As considerações acima nos preparam para analisar o papel de Nossa Senhora na Criação, que é especialmente recordado na liturgia escolhida pela Igreja para a Solenidade da Anunciação do Senhor.
O "fiat" de Maria Santíssima
Sobre a conhecidíssima e tão comentada passagem evangélica da Anunciação, pareceria não haver nada de novo a dizer. Entretanto, como um vinho excelente apresenta aspectos diferentes em cada safra, assim também acontece com o magno acontecimento da Encarnação do Verbo, no qual sempre descobriremos novas e magníficas maravilhas.
As aparências não estão à altura do acontecimento
"Naquele tempo, 26 o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, 27 a uma Virgem, prometida em casamento a um homem chamado José. Ele era descendente de Davi e o nome da Virgem era Maria".
Antes de entrar na análise da narração de São Lucas, é mister voltarmos nossa atenção para o local onde Se encontrava Maria Santíssima ao ser visitada pelo Arcanjo São Gabriel. Não se tratava de um magnífico palácio, como tantos artistas imaginaram, mas de uma casa muito modesta, com paredes de tijolos aparentes. Estava situada em Nazaré, uma cidade então insignificante, na qual a Sagrada Família viverá na pobreza, humildade e apagamento.
Não há neste episódio outros elementos cujas aparências estejam à altura do acontecimento que ali se daria, a não ser a presença da Virgem Maria, e também a de São José. Pois o elevadíssimo grau de santidade de ambos certamente transluzia em seus gestos, fisionomias e em todo o seu modo de ser.
No momento da Anunciação, Nossa Senhora rezava
28a "O anjo entrou onde Ela estava...".
O que fazia Maria Santíssima quando o anjo chegou junto a Ela? Sem dúvida, rezava, talvez considerando a desastrosa situação na qual se encontrava a humanidade. O povo judeu havia se desviado da prática da verdadeira religião e os pagãos, a começar pelos romanos, viviam numa tremenda decadência moral. Chegara-se ao que São Paulo chama "plenitude dos tempos" (Ef 1, 10).
É assim, com Maria Santíssima orando ao Pai recolhida no seu aposento, que São Bernardo descreve a cena da Anunciação, pondo em realce a importância da oração para Deus manifestar-Se. Pois uma coisa é evidente: as preces d'Ela comoveram os Céus: "A saudação do anjo, feita com tanta reverência, indica quanto as orações de Maria haviam agradado ao Altíssimo"3 - afirma o Doutor Melífluo.
Numa de suas meditações sobre a vida de Cristo, São Boaventura nos apresenta a jovem Maria levantando-Se à meia noite no Templo para fazer sete súplicas diante do Altar e rezando desta forma: "Eu Lhe pedia a graça de presenciar o tempo no qual haveria de nascer aquela Virgem Santíssima que daria à luz o Filho de Deus, de conservar-me os olhos para poder vê-La, a língua para louvá-La, as mãos para servi-La, os pés para ir aonde Ela mandar e os joelhos para adorar o Filho de Deus em seu regaço".4
Sua humildade A impedia de concluir quem haveria de ser essa Dama à qual desejava ardentemente servir, mas, possuindo ciência infusa e recebendo graças sobre graças, foi tecendo considerações até conceber em seu espírito, com total nitidez, a figura moral do Messias prometido. Maria "concebeu Cristo em sua mente antes de concebê-Lo em seu ventre", afirma Santo Agostinho.5

Ao ver iluminar-se o aposento por uma luz sobrenatural e aparecer diante d'Ela o Arcanjo São Gabriel, Maria não deu o menor sinal de espanto. Segundo vários autores, entre eles São Pedro Crisólogo e São Boaventura, Ela estava "habituada às aparições angélicas, as quais não podiam deixar de ser frequentes para Aquela que Deus havia cumulado de tantas graças, que reservava para tão altos destinos, e que os anjos reverenciavam como sua Rainha e a própria Mãe de Deus".6 Podemos, inclusive, conjecturar que o próprio São Gabriel não Lhe fosse desconhecido.
A graça crescia n'Ela a cada instante
28b"... e disse: ‘Alegra-Te, cheia de graça, o Senhor está contigo!'".
A expressão usada pelo Anjo para saudá-La tem um sentido muito profundo no qual vale a pena nos determos.
Nosso Senhor Jesus Cristo, Salvador da humanidade, é a única criatura que possui a plenitude absoluta de graça. Ele a teve desde o início, sem qualquer possibilidade de aumento. E quando o Evangelho afirma que Jesus "ia crescendo em sabedoria, tamanho e graça diante de Deus e dos homens" (Lc 2, 52), refere-se às manifestações exteriores de sua santidade. "Mas interiormente o tesouro de dons celestes,que O tornavam agradável a Deus, era tão perfeito que não podia crescer de maneira alguma".7
Não acontecia o mesmo com Nossa Senhora. Ao longo de toda a sua vida, foi incessante seu progresso espiritual, ora devido aos méritos sobrenaturais obtidos pela prática de incontáveis boas obras, ora como fruto da sua oração humilde, confiante e perseverante, ora,Anunciação por Manuel Alvarez - Museu Federic Marés - Barcelona.jpg no fim da sua existência, por efeito do Sacramento da Eucaristia. E isto sem falar dos incrementos de graça, de incalculáveis proporções, experimentados por sua alma no momento da Encarnação do Verbo, aos pés da Cruz e por ocasião de Pentecostes.8
Não houve, portanto, um instante no qual Ela não tivesse mais graça do que no anterior, como bem exprime Campana: "Em todos os momentos de sua vida, Maria foi penetrada por inteiro pelos raios divinos da graça; em cada minuto de sua existência, sua vontade mostrou-se dócil em render a Deus homenagem e glória; todas as pulsações de seu Coração foram sempre para Deus. [...] Essa ascensão de Maria rumo ao ideal de santidade era contínua, uniforme, sem solavancos, sem interrupção".9
Assim, quando o anjo A proclama "cheia de graça", indica estar sua alma participando da vida divina no maior grau possível naquele instante; mas um minuto depois essa plenitude já seria maior. E conclui o mesmo Campana: "Maria progredia em graça porque n'Ela se desdobravam sem cessar novas capacidades de graça, as quais eram logo preenchidas. Precisamente nisto consiste a diferença característica entre a plenitude de santidade de Maria e a de Jesus Cristo".10
Plenitude de superabundância
Com base no Doutor Angélico, Garrigou-Lagrange distingue três plenitudes de graça: absoluta, exclusiva de Cristo; de superabundância, privilégio especial de Maria; e de suficiência, comum a todos os santos.11 E explica o insigne teólogo dominicano: "Essas três plenitudes subordinadas foram justamente comparadas à de uma fonte inesgotável, à do rio que dela procede e à dos canais alimentados por esse rio para irrigar e fertilizar as regiões por ele atravessadas, ou seja, as diversas partes da Igreja universal no espaço e no tempo".12
Assim, desde o momento de sua criação, Maria Santíssima participou da vida divina mais do que todos os Anjos e todos os bem-aventurados juntos. A tal ponto, que se Ela lhes distribuísse todas as graças das quais cada um deles tivesse necessidade, nada Lhe faltaria, pois, "sob a forma de méritos, de orações e de sacrifícios, esse rio de graça remonta a Deus, oceano da paz".13 A plenitude da graça de Maria, afirma São Lourenço de Bríndisi, "só é compreensível para Deus, pois só Ele abarca o abismo imenso e o quase infinito pélago dessa graça".14
Causa da perturbação de Maria
29 "Maria ficou perturbada com essas palavras e começou a pensar qual seria o significado da saudação".
A reação de Nossa Senhora mostra a profundidade do seu espírito. Dotada de ciência infusa, Ela entendeu perfeitamente o alcance da altíssima afirmação do anjo, considerando não apenas o significado imediato daquelas palavras, mas também suas consequências e correlações com o panorama da História.
Contudo, sendo cheia de graça, um dos seus predicados era a humildade mais excelsa. Em nada preocupada consigo mesma, todas as suas cogitações voltavam-se para Deus e a salvação da humanidade: Quando virá o Messias? Quando se dará a redenção?
A presença de São Gabriel não Lhe causou qualquer perturbação. Sua saudação, porém, deixou-A com um ponto de interrogação, pois não podia imaginar que aquelas palavras pudessem ser aplicadas a Ela. Conforme esclarece São Tomás: "A Bem-aventurada Virgem tinha uma fé expressa na Encarnação futura: mas, por ser humilde, não tinha tão alta ideia de Si mesma. E por isso era preciso que fosse informada a respeito da Encarnação".15
Medo de macular uma humildade ilibada
30 "O anjo, então, disse-Lhe: ‘Não tenhas medo, Maria, porque encontraste graça diante de Deus'".
Embora sem mancha de pecado original, Nossa Senhora foi criada em estado de prova e percebia com toda clareza a necessidade da vigilância. Temia aplicar a Si as palavras do Anjo e, cedendo em algo ao orgulho, acabar por ofender a Deus.
"Não tenhas medo, Maria" significava: "Não vos preocupeis, porque vossa humildade em nada será atingida". Com essas palavras, São Gabriel A exorta a ter confiança de que jamais sairá do reto caminho. Não em razão dos seus méritos. Ele não diz: "Não tenhas medo porque és forte", mas sim "porque encontraste graça diante de Deus".
E por que encontrou Ela graça diante de Deus?
A resposta, no-la dá São Bernardo: "Se Maria não fosse humilde, não desceria sobre Ela o Espírito Santo; e, se Este não descesse, Ela não conceberia pelo poder d'Ele. Pois como poderia conceber d'Ele sem Ele? É claro, portanto, que, para Ela conceber d'Ele, ‘o Senhor olhou para a humildade de sua serva' (Lc 1, 48) muito mais do que para a sua virgindade; e, embora tenha por sua virgindade agradado a Deus, foi pela humildade que concebeu".16
E nós também procedemos assim? Tomamos cuidado com a vaidade, como o fez Nossa Senhora nessa circunstância? Somos cientes de que um pensamento de orgulho consentido pode ser o ponto de partida para uma séria decadência na vida espiritual? Ou aceitamos com delícias qualquer elogio, real ou imaginário, que nos seja feito? O ato de virtude que Lúcifer e os anjos maus não praticaram no Céu, nem Adão e Eva no Paraíso Terrestre, Maria Santíssima o fez da forma mais perfeita possível. Que exemplo sublime Ela nos dá, a nós tantas vezes preocupados em obter honrarias devidas ou indevidas!
"Será chamado Filho do Altíssimo"
31"Eis que conceberás e darás à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus. 32 Ele será grande, será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai Davi. 33 Ele reinará para sempre sobre os descendentes de Jacó, e o seu reino não terá fim".
Nestes três versículos, o Anjo indica as extraordinárias características d'Aquele que Nossa Senhora haveria de conceber. Elas estavam em perfeita harmonia com a Sagrada Escritura, a qual Maria Santíssima conhecia como ninguém, e com a rica imagem do Messias formada por Ela em seu espírito, ao longo dos anos.
Imaginemos qual seria a reação de uma jovem recém-casada daquele tempo, ao receber de um anjo a notícia de que o seu filho haveria de ser grande tanto na ordem sobrenatural: "será chamado Filho do Altíssimo", quanto na natural: "o Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai Davi". Impossível excogitar algo mais elevado!
Maria, entretanto, reage diante da comunicação do Anjo dando novas mostras de humildade heroica. São Gabriel lhe anuncia que será a Mãe do mais importante dos filhos de Israel: do próprio Messias! E Ela o ouve tranquila e serena, porque as suas preocupações estavam bem longe da glória pessoal.
Perplexidade diante do anúncio
34"Maria perguntou ao anjo: ‘Como acontecerá isso, se Eu não conheço homem algum?'".
Aqui resplandece a Fé de todo incomum de Nossa Senhora, ante o anúncio feito pelo Anjo. Ao ouvi-lo dizer "conceberás e darás à luzAnunciaciação por Perris Fontaines - Museu de Arte - Gerona.jpgum filho", reconhece tratar-se de fato de uma mensagem divina, e não põe obstáculo algum à sua realização. Porém, entre as graças dasquais Ela estava plena, reluzia um insuperável amor à virtude da castidade. Desposada com São José, combinou com ele manterem-se virgens por toda a vida.17 E é nesse sentido que se deve entender a expressão "não conheço homem algum". Podemos supor ter havido longas conversas entre Ela e São José a esse respeito, chegando à conclusão de ser claramente inspirado por Deus o voto de castidade feito por ambos. Mesmo com essa convicção bem arraigada na alma, Ela não duvidara das palavras de São Gabriel. Apenas apresenta-lhe sua perplexidade, visando conhecer mais a fundo como haveria de concretizar-se o desígnio divino.
Origem inteiramente sobrenatural do Verbo Encarnado
35 "O anjo respondeu: ‘O Espírito virá sobre Ti, e o poder do Altíssimo Te cobrirá com sua sombra. Por isso, o menino que vai nascer será chamado Santo, Filho de Deus. 36 Também Isabel, tua parenta, concebeu um filho na velhice. Este já é o sexto mês daquela que era considerada estéril, 37 porque para Deus nada é impossível'".
Quem senão Deus, seu Criador, conhecia o amor extraordinário da Virgem Santíssima à virtude da pureza? Por isso Ele, que é a Delicadeza em essência, teve o cuidado de mandar o celeste mensageiro resolver com extraordinária elevação e reverência sua santa perplexidade.
Conhecendo por instrução divina o problema que a maternidade divina levantava n'Ela, o anjo Lhe mostra que, assim como havia concedido à sua prima Isabel conceber um filho na velhice, a Onipotência divina poderia fazê-La conceber sem concurso de varão. E Ela, resplandecente de sabedoria e inteligência, entende em toda a sua profundidade as explicações do Anjo e logo as aceita.
A origem inteiramente sobrenatural do Verbo Encarnado foi revelada naquele momento. Que considerações não deve ter feito Maria ao conhecer o alcance desse acontecimento! Maria gerou no tempo a mesma Pessoa gerada pelo Pai na eternidade
38 "Maria, então, disse: ‘Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em Mim segundo a tua palavra!'. E o anjo retirou-se".
A escravidão é o estado mais deplorável para uma criatura humana. Pelo Direito Romano, quem caía nessa situação era considerado coisa, res, perdendo todos os direitos próprios à pessoa humana. E quando a Virgem Maria disse: "Eis aqui a serva do Senhor", o fez com total consciência, colocando-Se por inteiro nas mãos de Deus, com absoluta confiança na sua liberalidade.
A partir desse ato de radical aceitação, todo ele feito de humildade e de fé, operou-se logo em seguida a concepção do Verbo Encarnado no seu seio virginal. Consideremos agora um aspecto particularmente comovedor desse fiat.
O Verbo de Deus foi gerado pelo Pai desde toda a eternidade. Conhecendo-Se a Si mesmo, Ele gerou um Filho eterno sem concurso de mãe alguma, de uma forma misteriosa que nossa inteligência não consegue compreender. Ora, logo após o consentimento da Virgem - "Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em Mim segundo a tua palavra" -, o Espírito Santo iniciou n'Ela o processo de gestação do Verbo Encarnado. Ela tornou-Se Mãe sem concurso de pai natural.
Há, pois, entre o Padre Eterno e Maria Santíssima um paralelo de impressionante grandeza: ao considerar suas próprias magnificências, Este gera o Filho na eternidade; e Maria, pondo nas mãos de Deus sua própria contingência, gera o Filho de Deus no tempo!
Por ser a mais humilde de todas as criaturas, Nossa Senhora reproduz de algum modo a geração do Verbo na eternidade, ao dar origem na Terra à natureza humana de Nosso Senhor. O Pai criou todas as coisas no Verbo e pelo Verbo; pela Encarnação, Maria vai permitir ao Filho oferecer-Se em sacrifício ao Pai, para a recuperação de todas as coisas degradadas pelo pecado.18
O grandioso plano da Encarnação e da Redenção do gênero humano esteve na dependência desse fiat de Maria, porque se, por uma hipótese absurda, Ela não tivesse aceitado, não teria havido a Redenção.
A festa da harmonia no Universo
Como vimos no início deste artigo, Deus escolheu, entre infinitas possibilidades, criar o melhor dos universos, no qual tudo se ajusta em função de Nosso Senhor Jesus Cristo. Porque se Ele tivesse criado todos os seres no seu grau máximo de perfeição surgiria, paradoxalmente, uma tremenda deficiência, maior do que qualquer outra que possamos conceber: a do Verbo Encarnado não poder oferecer nada de Si para tornar mais elevada a Criação.
Devemos, portanto, nos alegrar com as nossas limitações e, em certo sentido, até com nossos pecados, pois eles permitem a Nosso Senhor exercer a misericórdia, derramando sobre nós, por meio de Maria Santíssima, aquilo que n'Ele existe em plenitude absoluta.
Porém, a fecundidade do Preciosíssimo Sangue de Jesus é tal que, ao reparar e perdoar, Ele não só nos restaura aquilo que perdemos, mas nos traz um complemento, dando-nos ainda mais do que anteriormente possuíamos. Dessa maneira, podemos alcançar, pela graça divina, aquilo que os seres mais perfeitos, se fossem criados, teriam por natureza.
Ora, foi a Virgem Maria, com sua disponibilidade e obediência, quem introduziu no cerne da Obra divina a Criatura cume e modelo arquetípico de tudo quanto existe, da Qual tudo deflui. Por isso, a Solenidade da Anunciação do Senhor celebra a restauração da harmonia no universo. É a comemoração do dia em que a Criação passou a transluzir com um brilho todo divino, pelos méritos de Maria Santíssima. (Monsenhor João Clá Dias, EP).

Hoje a Igreja celebra a Solenidade da Anunciação do Senhor. Que tenhamos a coragem e o despojamento de Maria em afirmar o nosso SIM diariamente. Paz e Bem!

ENCARNAR-SE DE DEUS NOS PEQUENOS 
“SIM” DE NOSSA VIDA ( Lc 1, 26-38 )

Hoje em toda a Igreja celebra-se a Festa da Anunciação do Senhor. A Virgem recebe a visita do anjo que lhe anuncia o projeto de Deus, e pede-lhe sua colaboração. Deus que tudo criou sem nós, agora num gesto de humildade, pede a sua criatura colaboração para realizar seu projeto de salvar toda a humanidade. Que mistério insondável de amor! A jovem e humilde Maria foi escolhida para esta grande missão, ser mãe do Salvador, ser mãe do Verbo encarnado. Deus respeita sua criatura amada, que somos todos nós. Ele se apresenta através de seu mensageiro, explica-lhe a missão, a alegria da escolha, e espera um ato livre. Ele não entra no mundo pela força, quis propor-se. Maria aceita, a proposta com humildade, reconhecendo-se pequena, diante do Mistério, abre-se, confia, não entende, mas acredita que Deus tudo pode. Ela dá seu Sim, “Faça-se em mim segundo a tua Palavra”, acolhe com humildade a Vontade Santíssima de Deus. Ela encarna-se de Deus. Todo o seu ser, está repleto de Deus. Antes de ser a Mãe de Jesus, já era toda de Deus, a Encarnação é a concretização da sua fé. “Antes de gerar Jesus no seu ventre, Maria já possuía Cristo no coração”, dizia Santo Agostinho. Maria era mulher de fé, vivia na fé, caminhava na fé. A encarnação é a prova de sua fé amadurecida, esclarecida, pronta a sacrificar sua vida por amor a Deus. Tão jovem, mas de uma fé tão profunda.  A prova maior de sua fé será grandiosa como a de Abraão. No alto da cruz ela terá que oferecer-se com seu Filho, pela salvação do mundo.
O ápice de seu Sim será na cruz com seu Filho Jesus Cristo. O anjo salva Isaac da morte no alto do Monte Moriá, Maria vê seu Filho ser torturado, morto de forma cruenta, e permanece com ele aos pés da cruz, e vê seu Filho morrer, e o toma nos braços depois de morto. Permanece de pé, e se torna a Virgem dolorosa. O sim de Maria é um Sim, para toda vida, seu Sim se firma no Sim do Filho de Deus, que aceita nascer entre nós, viver entre nós e dar sua por nós. Maria é aquela que escuta, confia e engaja-se plenamente na realização da vontade de Deus. Deus espera de nós cristãos, estas mesmas atitudes e virtudes de sua Maria. Deus espera de nós: ESCUTA, CONFIANÇA E ENGAJAMENTO, ADESÃO plena a sua vontade.
Maria pela fé gera o Filho de Deus e o oferece para nossa Salvação. Pela fé somos chamados a gestar também Jesus, pelas nossas atitudes. Encarnemos o Cristo, ou melhor deixemo-lo encarnar em nós, e fazer de todos nós sua morada, discípulos autênticos do Reino.  
Rezemos o Ângelus:
O Anjo do Senhor anunciou a Maria, e ela concebeu do Espírito Santo.
Eis aqui a Escrava do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua Palavra.
O Verbo se fez carne e habitou entre nós.
Rogai por nós Santa Mãe de Deus. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo. Amém!